E por fim... não mataram o Rei!

 
Resposta a um artigo - "E por fim... mataram o rei", publicado no jornal diário regional "Açoreano Oriental" no dia 6 de Fevereiro 2009
 
 
E por fim… não mataram o Rei!

 

 

"D. Carlos foi um dos maiores reis da sua Dinastia" alguém que "não se tira do horizonte da nossa consciência" (Raul Brandão, um dos políticos hostis ao Rei, 1918).

 

Faz neste mês de Fevereiro 101 anos que um jovem de 20 anos foi assassinado por um comando terrorista pela simples e única razão de ser filho de quem era. Seu Pai, o Rei de Portugal D. Carlos I, principal vi­sado, também morreu.
 

Considerado um dos mais inteligentes e competentes monarcas da época, D. Carlos foi morto por se ter mantido fiel à forma de monar­quia constitucional assente no po­der moderador do Rei, pilar do Es­tado de Direito.

A sua figura continua a desper­tar o maior interesse reconhecendo, hoje, a historiografia nacional, a importância da sua acção como Estadista.
 

Incluindo-me no número dos interessados pela História dessa al­tura e, inevitavelmente, do papel político do Soberano, fiquei perplexo perante o amontoado de dislates escritos num artigo publicado nes­te jornal, no dia 6 e Fevereiro, sob o título “E por fim… mataram o rei!”, assinado pelo sr. Alexandre Medeiros que se identifica como “educa­dor”.

Não fosse o alegado atributo do sr. Medeiros e, provavelmente, não me sentiria na obrigação de escrever estas linhas.
 
Por definição, educador é aquele que educa e educar é “fazer ad­quirir conhecimentos (...) cumprir boas maneiras, ensinar a adoptar um comportamento tido como so­cialmente correcto, etc.” (Dicioná­rio da Língua Portuguesa de 2008, Porto Editora). Ora, o que resulta da leitura do referido texto é o oposto do acto de educar, quer no cam­po do conhecimento histórico quer no âmbito dos direitos humanos e cívicos. Senão vejamos:
 

O sr. Medeiros aponta quatro deturpados factos históricos para ilustrar as “más políticas” de D. Car­los que o “conduziram para o inevitável - o regicídio”. Analisemo-los sumariamente:

 
a) Ultimatum inglês

Como é que, com seriedade, se pode atribuir a responsabilidade do Ultimatum ao Rei D. Carlos? A questão inglesa foi iniciada dez anos antes desse episódio, com An­drade Corvo. Após a morte de D. Luís, D. Carlos é aclamado Rei, com 26 anos, no dia 28 de Dezembro de 1889. O Ultimatum surge 14 dias depois, a 11 de Janeiro de 1890.

 
b) Golpe de 31 de Janeiro de 1891

Esta tentativa de golpe ocorreu quando o País estava na mais com­pleta tranquilidade. Face ao fracas­so e impopularidade do mesmo foi sintomática a sua condenação pe­las mais destacadas figuras do par­tido republicano.

 
c) D. Carlos nomeia e despede governos. Implantação da Ditadu­ra.

Ao tempo, a crise económica era grave e as inevitáveis crises polí­ticas sucediam-se face à impotên­cia para a combater dos dois partidos do poder (regenerador e progressista). Daí a necessidade, numa primeira fase, da demissão e no­meação, em alternância, de governos. Estas medidas eram adopta­das no uso do direito constitucional que assistia ao Monarca e que, hoje, competem ao Presidente da Repú­blica, aliás, direito esse exercido, em passado recente, pelo Presidente Jorge Sampaio e, também, pelo Gen. Ramalho Eanes. Quanto à chamada ditadura franquista, não passou de um governo de iniciativa presidencial chefiado por João Franco que, não fora o Regicídio, se manteria em funções até às eleições marcadas para 5 de Abril de 1908.

 
f) Intolerância com as oposições e Decreto do exílio de todos os opo­sitores.

Se houve na História de Portu­gal um Chefe de Estado tolerante para com os seus detractores foi o Rei D. Carlos, basta ler a lmprensa da época e as actas das sessões par­lamentares.

O referido decreto que exilava “todos” os opositores trata-se do di­ploma que o Monarca assinou, na véspera do Regicídio, a expulsar do Reino indivíduos pronunciados em tribunal pelo crime da conspiração falhada do dia 28 de Janeiro de 1908, como forma de lhes poupar a prisão.
 

São estes os factos apontados pelo dedo acusatório do educador Medeiros que, condescendentemente, reconhece, no entanto, inú­meras capacidades no campo in­telectual, artístico e diplomático (esqueceu-se do científico e do des­portivo) ao Rei D. Carlos, referindo com ironia que “a corte lisboeta vi­veu os últimos moments of glory com as sucessivas visitas déreis, rainhas as e presidentes”.

Presumo que esta displicente re­ferência às inéditas visitas de Chefes de Estado das principais potências europeias a Portugal preten­desse desvalorizar o elevado apreço que a figura de D. Carlos inspirava àqueles Estados e que constituiu factor determinante, através da política diplomática por ele delineada, para a consolidação do Império Ul­tramarino Português.
 
No que respeita à matéria de di­reitos humanos e cívicos, a minha apreensão não é menor. Embora desconheça a área educacional em que actua o educador em apreça, não deixa de ser preocupante imaginar que alguém com funções des­tinadas à formação e transmissão de conhecimentos admita elegitíme práticas de puro terrorismo de Estado.
 

Como é possível que se aceite, em pleno Estado de Direito, que por divergências políticas se assas­sine um Chefe de Estado? E quan­to ao seu filho, que espécie de ar­gumentos se podem aduzir para justificar tal barbaridade?

Quanto aos valores e opções po­líticas e sociais implantadas pela 1ª República propalados pelo edu­cador Medeiros são, mais uma vez, na melhor das hipóteses, fruto de confrangedor desconhecimento. A este respeito, os factos são eloquen­tes: nos 16 anos de greves, fome e bombas da 1ª República, conta­ram-se 8 Presidentes, 50 governos com duração média de três meses e meio, mais de duas dezenas de insurreições armadas, atropelos per­manentes aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e centenas de atentados políticos que incluí­ram a morte de um Presidente (Sidónio Pais) e de um Chefe de Governo (António Granjo) e ferimen­tos graves num indigitado Chefe de Governo no dia em que ia assumir funções (João Chagas).

O insuspeito Guerra Junqueiro, apercebendo-se cedo do rumo dos acontecimentos, desabafava em 1911:
“Já hoje, se fosse possível fa­zer um plebiscito ao País, não com papéis mas dentro da consciência de cada um, na escuridão do seu quarto, a maioria monárquica era esmagadora. Havia menos republi­canos do que antes do 5 de Outu­bro”.
 

Bastará ler com atenção a vasta bibliografia publicada sobre esta época para se perceber que o regime democrático constitucional com maiores semelhanças ao actual foi justamente o da Monarquia Constitucional, com a vantagem do Poder Moderador ser exercido por um Chefe de Estado naturalmente re­presentativo de toda a Nação e in­dependente de partidos políticos.

Posto isto, e se a postura educa­tiva do educador Medeiros for idêntica à evidenciada no seu infe­liz artigo, sugiro para bem dos seus educandos que pondere mudar ra­pidamente de profissão.

 

Por, Gonçalo Figueiredo de Barros

In, Açoriano Oriental

 

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E por fim… mataram o rei!

 

 

A 1 de Fevereiro, assinalou-se mais um aniversário da morte do Rei D. Carlos I e do seu filho primogénito, Luís Filipe. Am­bos foram assassinados naquele primeiro sábado de Fevereiro, do ano de 1908, em plena Praça do Comércio, na cidade de Lisboa.
 
O saudosismo monárquico evoca a efe­méride com cerimónias religiosas e demonstrações de indignação perante o re­gicídio. Também nos Açores a data não passou ao lado - a "Real" Associação da Ilha Terceira lá mandou celebrar uma Missa na Sé, em memória do penúltimo rei de Portugal e do seu filho que não che­gou a subir ao trono.
 

Mas Carlos de Bragança terá sido mes­mo um Mártir da Pátria? Será a sua morte trágica apenas uma conspiração republi­cana e maçónica para derrubar a monar­quia em Portugal?

Ou, por outro lado, as “más” políticas do monarca e a sua atitude eminentemen­te autocrática não o conduziram para o inevitável - o regicídio?

Estou em crer - calma, é apenas a mi­nha opinião - que o assassínio de D. Car­los surge como uma consequência da sua postura enquanto rei de Portugal!
 

Ora vejamos:

- É no seu reinado que se dá o “Ultima­to Inglês” - que se traduz na humilhação da “glória” portuguesa e numa “partilha” dos territórios ultramarinos com a Ingla­terra - e a classe dirigente do País nunca perdoou a D. Carlos esse real fracasso;

- Dois anos após a sua subida ao trono, em 1889, o monarca tem que lidar com a tentativa de revolução ocorrida no Porto a 31 de Janeiro de 1891 - e se, desta vez, a implantação da República em Portugal não passou de um pesadelo, o certo é que a “revolução” serviu para popularizar as ideias e os valores republicanos por todo o país;

- Carlos foi rei num tempo marcado pela crise política e económica: nomeava e despedia governos em cada seis meses e, aconselhado pelo “admirável” João Franco, teve a infeliz ideia de dissolver o Parlamento, implantando a ditadura em Portugal.

- Como se isto não fosse suficiente, D. Carlos sempre lidou mal com a oposição -chegando ao limite de assinar o decreto franquista, que destinava ao exílio nas colónias todos os seus opositores;

Por tudo isto, é fácil concluir que as mortes do rei e do seu herdeiro foram uma consequência da danosa governação de Carlos l de Portugal.
 

Apesar de lhe reconhecer inúmeras ca­pacidades nos campos intelectual, artísti­co e diplomático - foi no seu reinado que a corte lisboeta viveu os últimos “moments of glory”, com as sucessivas visitas de reis, rainhas e presidentes - não consigo olhar para o regicídio como um martírio pela Pátria, como o testemunho de alguém ca­paz de oferecer a sua vida pelos valores, pela história e pelo Povo de Portugal.

Contrariando muitas opiniões avaliza­das, ouso dizer que a República foi im­plantada em terra lusitana, porque os seus valores e as opções políticas e sociais que os seus ancestrais defensores anunciavam fo­ram capazes de suplantar uma monarquia em decadência - um regime obsoleto que se esqueceu das pessoas e dos ideais e ape­nas valorizava a aparatosa corte e as sucu­lentas caçadas de Vila Viçosa.

 

Por, Alexandre Medeiros

In, Açoriano Oriental

 

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