Jose Mattoso elege duas figuras como paradigmas nacionais: Alexandre Herculano e Dom Duarte
Filósofo,
místico e referência ética nacional, são três os adjectivos com que definiria
esta personagem ímpar da nossa vida cultural. Já foi monge e, perante a
perplexidade da vida, considera Deus, como aquele que “preenche todo o
vazio e responde a todas as perguntas” e critica acidamente os valores
prevalecentes, afirmando: “o domínio da técnica não garante o exercício da
sabedoria”.
Embora acreditando nas virtualidades do 25 de Abril, nem por isso, se revê nos
seus frutos: “incapazes de resolver problemas relacionados com a organização
social e económica, os políticos desenvolveram estratégias de ataque pessoal e
de descrédito, que ainda hoje dominam a luta pelo poder”. E elege duas figuras
como paradigmas nacionais: Alexandre Herculano e Dom Duarte, não se esquecendo
de Camões, “épico” demais para o seu gosto e Fernando Pessoa, que considera
“demasiado paradoxal”.
Soberania do Povo (SP): Porque veio parar a esta terra? José Mattoso (JM): Eu morava em Mértola, mas vivi em Timor durante cinco anos e
meio. Regressei a Mértola, com alguns problemas de saúde. Verifiquei que, aí, a
assistência médica não estavam devidamente garantida. Resolvi então, com minha
Mulher, entregar a nossa casa e os meus livros ao Campo Arqueológico de
Mértola, como estava prevista na doação com reserva de usufruto que tinha feito
há anos, e passar a viver numa casa de campo que minha mulher herdou em
Carvoeiro do Vouga.
SP: O que acha destas gentes e do meio?
JM: Contacto sobretudo com os vizinhos, com um pequeno grupo de amigos de
infância de minha mulher e com os responsáveis pelos serviços de saúde de
Macinhata, de quem tenho recebido os mais simpáticos testemunhos de amizade. Se
aqui houvesse alguma associação cultural, na qual pudesse colaborar em alguma
actividade útil, talvez tivesse mais contactos com as pessoas daqui. Não é o
caso. Tenho alguns contactos com o meio cultural de Albergaria e de Aveiro, mas
sem nenhum compromisso. A minha idade obriga-me a restringir este género de
actividades.
SP: Como preenche o seu dia-a-dia?
JM: Continuo a ter alguns compromissos profissionais, como o de membro do
Conselho Científico para as Ciências Sociais e Humanas da Fundação para a
Ciência e a Tecnologia, o que me obriga a ir regularmente a Lisboa e dar
pareceres sobre questões relacionadas com essa actividade. Além disso colaboro,
na medida do possível, com o Instituto de Estudos Medievais da Universidade
Nova de Lisboa, de que sou membro, e tenho feito algumas conferências em
colóquios e encontros de História e de Espiritualidade. De vez em quando,
recebo a visita de antigos colegas e amigos. No tempo livre que me resta, gosto
de ler textos clássicos. Agora ando a ler os Sermões do Pe. António Vieira. Só
conhecia uns dois ou três.
Fonte: Soberania do Povo (VER EDIÇÃO SP IMPRESSA)
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